Sertão é por os campos gerais a fora e a dentro,
eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucuia...
Lugar sertão se divulga: é onde os pastos
carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas,
sem topar com casa de morador...


Sertão é o sozinho(...)Sertão: é dentro da gente.



sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Três Marias - A Chegada.

Desde o começo da viagem me auto intitulei uma “caçadora de pracinhas”. Isto porque, em toda cidade que chegava, perguntava pelo seu centro; o que, normalmente, era sempre composto de uma igreja com uma pracinha em volta. – No centro era sempre mais fácil encontrar restaurantes, hotéis e pessoas para me informar. – Só que em Três Marias foi diferente – e aí que comecei a perceber que pracinha não é regra – : o centro lá era os arredores da rodovia 040.


Quando considerei que tinha entrado na cidade, duas meninas sentadas na mureta de um canteiro suspenso da calçada me informaram que ali já era o centro. Estranhei: – Um lugar à margem da rodovia, com um posto de gasolina na esquina de cima e, logo abaixo, margeando uma rua, algumas barraquinhas e trailers de comércio improvisado? Onde estava a praça com a igreja, o comércio tradicional, a história da cidade? –. Confesso que fiquei um tanto desapontada pois imaginava que Três Marias fosse uma cidade grande, organizada a partir de um centro com pracinha. – Ignorância minha por não saber que aquela é uma cidade nova, que não completou nem cinquenta anos de emancipada, e tem na represa da Cemig seu principal fator de desenvolvimento.


Enfim, descobertas a parte, naquela hora me interessava encontrar um hotel para passar a noite. Já tinha pedalado o dia todo; não estava exausta, mas ávida por um banho quente e comida. As garotas não souberam indicar direito um hotel barato e perto dali, então decidi circular por dentro da cidade para me informar.


Foi então que, em frente a uma farmácia, consegui não só uma boa dica de hotel mas uma família de pai, filho e cachorro para me acolher. Por duas noites fui sua hóspede, com direito a pensão completa. Tamanho fora o despreendimento de seu Geraldo e o filho, André, que fiquei sem ação, admirada com o gesto generoso e cheio de carinho. Sem dúvida, eram a prova de que ainda existe muito amor no mundo.


Conheci seu Geraldo quando o escolhi para perguntar sobre hotel para passar a noite. – Ele conversava alegremente com uma moça –. Imediatamente identificou que eu viajava de bicicleta e disse que seu filho iria gostar muito de me conhecer: - o André gosta muito de bicicleta, já teve umas caras, vivia fazendo trilha por aí, ia longe –. Ficou muito feliz de saber que eu vinha dos “Gerais” (o alto onde situa-se Buritizinho), pois era sua região de nascimento. Indicou-me o hotel dizendo para pedir desconto na recepção “que o dono era seu amigo” (disse para que eu o mencionasse), e, em seguida, convidou-me para jantar em sua casa.


Encontrei o hotel, guardei a bike (mais uma vez subi alguns lances de escada carregando a bichinha), tomei um banho e fui para meu “compromisso”. – A casa de Seu Geraldo era perto dali, um ou dois quarteirões para baixo do hotel.
Cheguei quase oito da noite. Seu Geraldo, o filho, a namorada e um amigo já estavam jantando na cozinha. Sem formalidades, me serviu um prato com arroz, feijão, bolinhos de abobrinha – que eu tive que adivinhar do que eram – e salada de tomate; também um copo de suco.


Seu Geraldo e André, muito descontraídos, davam o tom da conversa, interessados em saber sobre os lugares por onde passei. André contou da época em que pedalava – curtia mais montain-bike – e das temeridades que cometia sobre duas rodas. Depois embalamos na conversa sobre os caminhos do rio São Francisco. Comentei que pretendia seguir o rio até Pirapora, mas não conhecia estradas até lá que fossem pela margem: – Talvez descer de barco?, questionei.


André disse que era possível fazer de barco, mas que não seria barata uma travessia daquela devido à distância: – mesmo que te cobrem só a gasolina vai ser caro, concluiu –. Contou sobre quando fez essa viagem de caiaque com alguns amigos (ele e o pai então travaram uma discussão sobre o trecho mais perigoso da travessia, a chamada Cachoeira Grande; que, pelos seus relatos, é uma passagem estreita do rio depois da represa, em queda e com grande volume de água: – um lugar para barqueiros experientes, afirmaram. Seu Geraldo e o filho discutiam a largura da passagem: André garantia que era bem estreita, Seu Geraldo negava dizendo que tinha mais espaço do que o filho projetava. De qualquer modo, concordavam que era um passeio lindo).


Após o animado jantar, Seu Geraldo disse que eu não precisava ficar no hotel pois ele oferecia sua casa. André, entusiasmado com a história de eu estar viajando motivada pela literatura de Guimarães Rosa, disse que eu iria gostar de conhecer sua mãe, uma literata, segundo ele. Combinamos então que na manhã seguinte eu fecharia minha conta no hotel e iria para sua casa logo cedo; visitaríamos a mãe dele e um pouco da cidade.

Um comentário:

  1. Viagem perfeita!!!
    Parabéns...Tudo de bom!!!
    Djeyson.
    Dá uma olhada no vídeo da viagem que fiz pela Estrada Real.
    http://www.youtube.com/watch?v=r_qslIbat94

    ResponderExcluir