Sertão é por os campos gerais a fora e a dentro,
eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucuia...
Lugar sertão se divulga: é onde os pastos
carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas,
sem topar com casa de morador...


Sertão é o sozinho(...)Sertão: é dentro da gente.



sábado, 2 de março de 2013

23/05 – "No mato, o medo da gente se sai ao inteiro, um medo propositado".


O Paredão existe lá. Senhor vá, senhor veja. É um arraial. Hoje ninguém mora mais. As casas vazias. Tem até sobrado. Deu capim no telhado da igreja, a gente escuta a qualquer  entrar o borbôlo rasgado dos morcegos. Bicho que guarda muitos frios no corpo. Boi vem do campo, se esfrega naquelas paredes. Deitam. Malham. De noitinha, os morcegos pegam a recobrir os bois com lencinhos pretos. Rendas pretas defunteiras.

Eu ia para o Paredão. Rômulo informou que seriam 94km até lá, sendo apenas vinte pelo asfalto. Apesar das observações sobre as onças - “elas costumam seguir a presa por horas e até dias se estiverem com fome, esperando o momento do descuido ou do descanso para o ataque” -, aconselhou que eu tomasse cuidado com as cobras, bastante comum na região. E me ensinou uma oração para afastá-las:

“Valha-me, Deus, São Bento.
Buraco velho tem cobra dentro.”
  
Deveria pedir para o santo protetor que as tirasse do meu caminho. E seria ideal também carregar alguns dentes de alho, pois "o alho também afugenta os bichos peçonhentos".  
Eram sete da manhã quando deixei a pousada, depois de tomar um farto café da manhã e anotar as recomendações.

Elas realmente podem ser encontradas na estrada. Nas duas viagens a Paredão encontrei esta espécie de cobrinha branca. Na última viagem (02/2013), infelizmente, atropelei uma delas. 

Sem dúvida, o caminho para o Paredão fora o mais árduo de toda a viagem, demorei nove horas para cumprir o trajeto – 10km/h. Neste trecho, pedalei sobre todos os tipos de pisos possíveis: com pedras, cascalho fino, cascalho grosso, costelinha e areia - muita areia!. Cheguei no povoado com fome e um tanto cansada. A certa altura, concluí que deveria racionar água, pois a garrafa já estava pela metade e ainda faltavam 50km para percorrer. Porém, como se fosse providência divina, alguns minutos depois da constatação, dois pescadores que voltavam de carro do Paracatu, me forneceram mais um litro de água.    

Paredão é o lugar onde ocorre a batalha final de Grande Sertão: Veredas, onde Diadorim enfrenta cara a cara o caçado inimigo Hermógenes. É um povoado relativamente isolado, pois está a 90km de Buritizeiro, de onde é distrito; 60km de Santa Fé (necessitando atravessar o Rio Paracatu), e aproximadamente 50km de outros povoados nas margens do Paracatu e do outro lado do Rio do Sono. Atualmente, o transporte até a cidade é facilitado por um ônibus da prefeitura que faz a linha até quatro vezes na semana, e por carros e motos de alguns moradores; entretanto, a estrada principal de acesso a Paredão ainda é ruim, repleta de atoleiros (seja na areia seca ou molhada) e buracos; exceto um pequeno trecho de não mais que oito kilômetros possui uma boa cobertura para a rodagem, um cascalho fino chamado de toá, ou curiacanga.  


A viagem estava difícil, ninguém não passava ali para eu perguntar se estava na direção certa, e não havia nenhuma casa; os sessenta kilômetros de estrada vicinal eram muito ermos: apareceram somente dois carros, duas motos e um caminhão num período de aproximadamente seis horas – mas, felizmente, não era um deserto absoluto. A tensão por estar sozinha em um lugar desconhecido, tão vazio e habitado por onças e cobras, se acentuava pelo silêncio e o sol impiedoso.


Para vencer o medo, não tinha nada a fazer exceto repetir a oração a São Bento, respirar e seguir. Para vencer o sol, protetor solar, mas muito protetor solar (spray), tanto que caiu nos olhos e isto acabou sendo o único problema real de toda a viagem. Pelo menos sete kilômetros, pedalei quase sem conseguir enxergar, chorando. A situação me irritou, e eu gritava, pedalava com raiva, xingava a mim mesma: Vai, sua idiota; não foi você quem inventou essa viagem? Agora aguenta! Pedala, sua besta!...


Eram quatro da tarde quando cheguei em Paredão. Na entrada do povoado, um mata-burro e um campo de futebol ao lado. Aquele parecia um lugar esquecido no tempo, um elo perdido da história. Estava feliz de ter encontrado o cenário do desfecho de Grande Sertão:Veredas.  
             

Reportagens e entrevistas

JORNAL DE TRÊS MARIAS (2011)

clique na imagem para ampliar

JORNAL O GLOBO (ON LINE), BLOG DE BIKE (2012)

(Obs. As fotos foram removidas da postagem. Para ver a reportagem na íntegra, visite o site no endereço abaixo)

http://oglobo.globo.com/blogs/debike/?a=994&periodo=201203 


GrandesVeredas no Dia da Mulher
por Luiz Filipe Barboza



Dia Internacional da Mulher, a melhor homenagem que imaginei à meia-dúzia de quatro ou cinco leitoras fiéis deste blog foi contar aqui a aventura de uma mulher e sua bicicleta. Fã de "Grande Sertão Veredas", livro escrito em 1956 por Guimarães Rosa (para saber mais sobre a obra clique aqui), a paulista Ana Luisa Vasconcelos pegou a bike e resolveu cumprir, na base do pedal, o roteiro do clássico da literatura nacional pelo interior de Minas Gerais e Goiás. Conheceu gente e lugares que remetem à história emocionante de Riobaldo e Diadorim, que muitos anos atrás foi série de TV estrelada por Tony Ramos e Bruna Lombardi. 


A experiência encantadora de Lisa, como eu descobri que os mais chegados do interiorzão de Sampa a chamam, durou 46 dias e rolou no ano passado. É admirável a coragem dessa mulher de 20 e alguns anos, que tem meio jeio de menina, assim como seu espírito desbravador, para se meter sozinha com sua bicicleta por lugares que não conhecia e viver descobertas que devem ter sido mesmo incríveis. Detalhe: a viagem foi a primeira da Ana de bicicleta!

"A viagem começou em Belo Horizonte. Tomei um ônibus no Rio, embarquei a bicicleta e fui para a capital mineira. Como ficaria três dias na cidade antes de partir, agendei uma noite em um hostel e contatei amigos que pudessem me receber na cidade. Depois de BH já não tinha nenhum local para pouso previsto. O planejamento era sempre chegar na localidade definida daquele dia e então procurar alguma estalagem para passar a noite. Minha única condição era evitar passar a noite na rua, ou na estrada, pois não levava equipamento para isso, como barraca. Se no local não houvesse nenhum tipo de infraestrutura hoteleira, apelava para a boa vontade das pessoas e humildemente pedia pouso na casa delas. Fiz isso três vezes, e outras quatro fui convidada por elas." 

São tantos relatos da Ana que vou dividí-los em mais de um post. Neste, alguns comentários dela. Em próximo post, um bate-papo mais detalhado sobre a viagem e o roteiro. 

"Houve vários momentos inesquecíveis durante a viagem. A cada parada, uma novidade tornava a aventura mais feliz, mais fundamental para o que eu estava buscando – até os medos eram fundamentais para caracterizar o Sertão que eu perseguia. Acho que a melhor lembrança é na verdade saber que realizei de fato esta viagem, que tudo foi real e como diz Riobaldo, personagem central do livro: 'O senhor vá lá, verá. Os lugares sempre estão aí em si, para confirmar."

Como surgiu a ideia do roteiro:

"Sempre tive um grande apreço pelo estado de Minas Gerais, pela paisagem mineira, o acervo arquitetônico do período colonial e as vastidões do interior. Em 2010, li Grande Sertão: Veredas e fiquei mais encantada ainda para conhecer melhor Minas. Quando resolvi que viajaria de bicicleta, pensei primeiro em fazer o caminho das cidades históricas, utilizando a Estrada Real como rota, mas mudei os planos quando encarei que viajaria sem prazo para voltar. Então decidi por um trajeto mais longo, que me levaria a conhecer as paisagens e lugares de Grande Sertão: Veredas. De certo, o que eu queria mesmo era me perder em vazios poéticos. E não poderia haver veículo mais apropriado para entrar no espaço e no tempo de Guimarães Rosa do que a bicicleta" 



Ontem comecei a contar aqui a viagem de bicicleta que a Ana Luisa Vasconcelos fez pelos caminhos do clássico Grande Sertão: Veredas , percorrendo o interior de Minas Gerais pela trilha que leva à história dos heróis de Guimarães Rosa Riobaldo e Diadorim (veja a parte I). No post da parte III, o epílogo, que será amanhã, vou mostrar um monte de fotos das paisagens incríveis que nossa aventureira Ana registrou. 
Ana ficou 46 dias em companhia da bike e das pessoas que ia conhecendo pela jornada. Foi a primeia viagem dela em bicicleta. Foi meio assim: um dia a Ana acordou com vontade de viver uma aventura de pedal e duas rodas. Procurou a consultoria de um amigo ciclista para se equipar e foi à luta. Guerreira, ela. 
A gente bateu um papo sobre tudo o que rolou por lá. Mais abaixo no post, o roteiro da Ana.


Como surgiu a ideia da viagem? 
Desde minha adolescência, quando costumava fazer pequenos circuitos de bicicleta, na cidade de São José do Rio Pardo (SP), onde nasci, surgiu a ideia de viajar com esse veículo. Pelo hábito, percebi que era possível empreender grandes distâncias sobre a bike. Guardei o desejo e um dia, entediada com a vida, resolvi que era a hora de colocar em prática o sonho. 

Por que escolheu o roteiro de Grande Sertão: Veredas? 
Parece que Minas guarda mistérios, segredos de todos nós escondidos no silêncio das veredas. Quando resolvi que viajaria de bicicleta, pensei primeiro em fazer o caminho das cidades históricas, utilizando a Estrada Real como rota, mas mudei os planos quando encarei que viajaria sem prazo para voltar. Então decidi por um trajeto mais longo, que me levaria a conhecer as paisagens e lugares de Grande Sertão: Veredas. De certo, o que eu queria mesmo era me perder em vazios poéticos. E não poderia haver veículo mais apropriado para entrar no espaço e no tempo de Guimarães Rosa do que a bicicleta. 

Você teve alguma preparação especial? Alimentação e preparação física antes da viagem mudaram? 
Na verdade não encarei nenhuma disciplina séria antes de viajar. Somente procurei realizar um 
percurso de quase 100 km antes para ver como me sairia, afinal nunca tinha pedalado distâncias acima de 50 km de uma só vez, e aumentei a frequência de pedaladas em terreno de aclives, como Paineiras, Alto da Boa Vista e Sumaré, para ganhar mais resistência. Alimentação e preparação física não mudaram. Tive consultoria especial de Roberto M. Dias, da Pedal 2, que além de me levar para conhecer os roteiros clássicos de treinamento no Rio e de me orientar sobre a atividade de cicloturismo, montou a bicicleta, deu um cursinho rápido de mecânica básica, ajudou a pensar o trajeto da viagem e foi meu principal contato durante toda a aventura. A indicação da Pedal 2 veio de Antônio Olinto Ferreira, brasileiro que já deu a volta ao mundo em bicicleta e é uma das pessoas mais ativas no cenário do cicloturismo nacional. 

Teve alguma preocupação específica? E segurança, local para dormir ou coisa assim? 
O planejamento era sempre chegar na localidade definida daquele dia e então procurar alguma estalagem para passar a noite. Minha única condição era evitar passar a noite na rua, ou na estrada, pois não levava equipamento para isso, como barraca. Se no local não houvesse nenhum tipo de infraestrutura hoteleira, apelava para a boa vontade das pessoas e humildemente pedia pouso na casa delas. Fiz isso três vezes, e outras quatro fui convidada por elas.


E segurança?
Era a minha maior preoupação. Imaginava que pudesse sofrer algum tipo de violência na estrada, me apavorava a idéia de violência sexual, então comprei um spray de cola e um canivete (o de pimenta está proibido), que usaria caso me sentisse ameaçada. Levava os objetos em local de fácil acesso e quando não me sentia segura deixava-os nos bolsos da camiseta (usava camisetas dry fit de ciclismo para pedalar). Em certas ocasiões, deixava o canivete debaixo do travesseiro na hora de dormir. Mas, felizmente, não tive que usar nada, não houve sequer uma situação onde tenha sido ameaçada ou desrespeitada. Ao contrário do que imaginava, me trataram sempre muito bem na estrada. 

Como é sua bike? Que acessórios você tem nela e o que acrescentou para a viagem? 
Minha bike foi montada considerando o fim para o qual seria usada e o melhor custo benefício. O quadro escolhido sob medida é da Canadian, modelo montain bike, a relação toda Shimmano, 24velocidades, pneus slik, aros duplos com raiação inox. Como acessório, somente leva um bagageiro reforçado de alumínio, caramanhola e velocímetro. Não acrescentei nada específico para esta viagem. 

Qual foi o momento mais feliz da viagem?  
Não dá para fazer este tipo de mensuração. Pois houve vários momentos felizes por diferentes 
motivos e outros tensos, também por diferentes motivos. Cordisburgo foi lindo pela visita ao museu Guimarães Rosa e à Gruta de Maquiné. Também foi uma grande felicidade chegar em Curvelo, pois alguns homens me amedrontaram dizendo que a estrada para lá era perigosa, cheia de bandidos e era tarde quando comecei a pedalar para lá. Em Morro da Garça me senti como personagem do Sítio do Pica Pau Amarelo, tal era o aspecto da casa onde me hospedei e o clima da cidade, uma delícia. Penso que os momentos mais felizes foram aqueles em que estive com o pessoal mais rústico e nos lugares que pareciam mais distantes da civilização. Buscava algum tipo de passado, de esquecimento, e em lugares como Barra do Rio de Janeiro, Paredão de Minas e Rio do Ouro, entre os municípios de Arinos e Chapada Gaúcha, encontrei este clima arqueológico. 

E o mais tenso?
Foi sem dúvida entre Buritizeiro e Santa Fé de Minas. Depois de Três Marias as distâncias entre as localidades aumentam muito e não conseguia encontrar nada numa distância de 50km ou um pouco mais. Como estre trecho fora quase todo feito em estrada de terra, após alguns quilômetros pelo cerrado fechado e pouco ou nenhum habitante por perto, o medo começava a agir tornando a viagem mais cansativa. Depois de Santa Fé, evitei pedalar por terra até Urucuia, pois me sentia estressada para enfrentar o vazio dos caminhos rurais. 

O que foi mais difícil?
Pedalar em solo extremamente arenoso. A cada nova estrada com bancos de areia não acreditava que aquilo não pudesse acabar. Mantinha minha esperança que aquelas condições eram passageiras e que no próximo trajeto tudo melhoraria, mas que nada, conforme rumava para o norte, mais era alertada de que a quantidade de areia das estradas aumentaria. 

Como reagiam à sua presença?
As pessoas que me conheciam, em geral, me tratavam com muita cordialidade, e percebi que o que mais chamava-lhes atenção sobre mim era eu estar fazendo aquela viagem sozinha. Mais do que a surpresa de ser uma viajante de bicicleta, o que intrigava as pessoas era imaginar que eu me metia em estradas – que elas medravam – sozinha. Valorizavam-me por acharem aquela uma atitude muito corajosa. Muitos pensavam que ganhava um bom dinheiro para fazer a viagem, pois não entendiam o motivo da iniciativa. 

O que a viagem proporcionou?  
Sem dúvida o melhor da viagem foi a experiência de liberdade. Penso que sentir-se livre é sentir-se capaz de realizar coisas, de tomar decisões, de agir, algo relacionado diretamente com a autoestima. Nunca me senti tão feliz e viva antes disso. Coragem e força é o que obtive desta viagem. Descobri uma resistência que não sabia que tinha, e o prazer de estar entre desconhecidos – o prazer de ser sem raíz. Mais do que isso aprendi que há muito amor neste mundo, e que não há melhor moeda que a atenção e a simpatia. 

Como era para se alimentar ou cuidar da higiene pessoal e das necessidades básicas? 

Sempre levava algum alimento nos alforges. Quando não era possível almoçar porque ainda estava na estrada e em lugar ermo eram meus biscoitinhos e frutas que me salvavam até encontrar algum ponto de parada. Em duas ocasiões, pedi comida em fazendas. Com relação a higiene e necessidades básicas, resolvia nos locais de pouso. Roupa íntima lavava no chuveiro e peças maiores foram lavadas em pousadas com estrutura. 

Você pretende fazer outro passeio deste tipo? 
Sim. Gostei da experiência de atrelar literatura ao cicloturismo. Penso em percorrer os sertões de Euclides da Cunha e pesquisar ainda outros autores cujas obras abordam o espaço geográfico como Monteiro Lobato, Érico Veríssimo, João de Minas, entre outros. 

Como é a sua relação com a sua bike? Mudou depois da viagem? 
A bike é meu veículo para tudo e de toda hora. De tanto usar bicicleta, hoje quando viajo de ônibus ou carro sinto mal-estar. Isso não acontecia antes de assumir a bicicleta como meio de transporte. Considero a bicicleta uma das melhores invenções humanas, um objeto incrível. Para mim é um símbolo de humildade, força, respeito e amizade. Depois da viagem, me apeguei mais a ela, vendo-a como a companheira para todos os momentos. 

O ROTEIRO DA ANA E COMENTÁRIOS DELA

Dia 1 - Araçaí 

Dia 2 - Cordisburgo e Curvelo
Cordisburgo é a cidade onde nasceu Guimarães Rosa, visita ao museu (onde fora sua casa) e ouvir contos do autor contados pelos guias do museu - os chamados Miguilins (crianças treinadas para orientar a visita) 
Gruta de Maquiné 

3 - Diamantina 
Fui de ônibus. Acontecia a Vesperata no dia em que passei lá. Evento musical que ocorre um sábado por mês nas ruas do centro da cidade. 

4 - Curvelo e Morro da Garça 

5- Buritizinho/ Três Marias 
Encontro com Diego (garoto que conheci em Buritizinho - povoado entre Morro da Garça e Três Marias - que, dizendo-se preocupado com minha viagem, me seguiu de moto até Três Marias e depois de me encontrar na rua quase dez horas da noite na cidade, pediu para que eu fosse tomar uma coca-cola com ele). 

6 - Três Marias 
Passeio pela cidade com André (filho de seu Geraldo que me conheceu quando cheguei na cidade e perguntava por hotel, e me convidou para me hospedar em sua casa) depois corte de cabelo em evento organizado pela mãe de André para reciclagem de cabeleireiros. Fui cobaia. 

7 - Andrequicé 
Visita ao museu Manuelzão. Descoberta de Barra do Rio de Janeiro como o local onde Riobaldo conhece Diadorim; da viagem a cavalo de Guimarães Rosa em comitiva da fazenda Silga (Sirga - Três Marias) até Araçaí. Histórias das fazendas Santa Catarina e vereda São José, próximo à Buritizinho. Entrevista para o jornal de Três Marias. 

8 - Barra do Rio de Janeiro 
Acampamento com João Lúcio e amigos dele no rancho do Nem. História do encontro de Riobaldo e Diadorim. 

9 - Barra do RJ 
Visita ao cemitério da Silga onde está enterrada a mãe e a primeira esposa de Manuelzão. 

10 - Buritizeiro 
Trecho mais longo da viagem e onde o medo (stress) começou a se manifestar com mais força. 130km, aprox. 60km de terra 

11 - Barra do Guaicuí
Visita à ruína da igreja de 1635 às margens do rio das Velhas. Caramanhola quebrada e improviso com borracha feita por seu Edson. 

12 - Paredão 
Local onde acontece a batalha final de o Grande Sertão, Diadorim e Hermógenes morrem. 
Missa com seu Sidraque e Padre Lindomar. Rosquinhas na casa de Dona Irani. Histórias de seu marido de quando houve a gravação da minissérie da Globo no local (frutas desconhecidas, e peixe para Tarcísio Meira). Caminho difícil até Paredão. 90km, aprox. 70km de terra. 

13 - Paredão 

14 - Santa Fé
Cansaço, medo e resistência. 

15 - Brasilândia 
Crianças: minhas companhias na cidade e guias de turismo. Entrevista para o Jornal de João Pinheiro. Local de nascimento de Riobaldo. 

16 - Brasilândia 

17 - Riachinho 

18 - Sagarana 
Ter que pedir pouso em casa de família. Conversa com vereador e suplente de vereador. 
Em Grande Sertão: Sagarana se chamava Boi Preto e era fazenda de um tal Eleotério Lopes. Hoje é distrito de Arinos. 

19 - Urucuia 

20 - Arinos
Arinos chamava-se Barra da Vaca e Urucuia, Porto de Manga. Urucuia pertencia ao município de São Francisco e Arinos primeiramente ao município de Paracatu, depois a São Romão. 
Ainda em Arinos: a família de Durval (que me acolheu e me encheu de boas histórias verídicas), a presença na padaria: o melhor pão do Centro-Oeste (Itamar Ribas, irmão de Durval, ganhou o prêmio de melhor receita de panificação do Centro-Oeste com seu pão de tamarindo, que eu provei e aprovei - muito bom mesmo! O mesmo também ganhou segundo lugar na competição nacional com a receita do pão de baru, semente do cerrado) 

21 - Chapada Gaúcha
Caminho até Rio do Ouro, família de seu Caetano no meio do nada. O "Texas" (fazenda de soja logo próximo a Rio do Ouro). Contrastes. Parque Nacional Grande Sertão Veredas. Seu Samu (com sua esposa, os últimos moradores do parque). Histórias de onça e sucuri. 

22 - Chapada Gaúcha 

23 - Arinos 

24 - Buritis 

25 - Buritis 
Cachoeira da Barriguda e encontro com famílias de assentados. Pedalando na correria para chegar em Buritis antes do anoitecer. Trecho de terra no escuro. 

26 - Cabeceiras de Goiás
Histórias de caminhoneiros e de fantasma (povoado de Vila Serrana - antes de chegar em Cabeceiras). D. Eleniza: o culto evangélico a que tive de ir. 

27 - Formosa 

28 - Pernoite em Goiânia 

29 - Goiás Velho
Trabalho na pousada do Carioca, festival de cinema (FICA) e visita ao museu Cora Coralina. Fiquei onze dias lá. 

39 - Itaguarí 

40 - Pirenópolis 
Encontro com Bruno, ciclista profissional de Brasília que me convida para ficar em sua casa. Corpus Christi e Cavalhada. 

41 - Pirenópolis 

42 - Aparecida de Loiola: fogueira, pipoca e quentão; mais festa de aniversário. 

43 - Brasília: competição estrada de ciclismo. 


Para encerrar a saga por Grande Sertão: Veredas, a aventura ciclística de Ana Luisa Vasconcelos que durou  46 dias e três capítulos no blog, vejamos neste post fnal as paisagens e os pisos pelas quais passou nossa desbravadora do sertão mineiro.  

"Acho que a melhor lembrança é na verdade saber que realizei de fato esta viagem, que tudo foi real e, como diz Riobaldo, personagem central do livro, 'O senhor vá lá, verá. Os lugares sempre estão aí em si, para confirmar'."  


"Nunca me senti tão feliz e viva antes disso. Coragem e força é o que obtive desta viagem. Descobri uma resistência que não sabia que tinha, e o prazer de estar entre desconhecidos – o prazer de ser sem raíz".




FOLHA REGIONAL - EM BRASILÂNDIA DE MINAS (2011)




 

(entrevistador: Valdson Rosca)



terça-feira, 22 de janeiro de 2013

22/05 - Barra do Guaicui


 No Guararavacã do Guaicuí, Riobaldo vive dias de descanso ao lado de Diadorim e reconhece o grande amor pelo amigo:


Lugar perto da Guararavacã do Guaicuí: Tapera Nhã, nome
que chamava-se. Ali era bom? Sossegava. Mas, tem horas em que
me pergunto: se melhor não seja a gente tivesse de sair nunca do
sertão. Ali era bonito, sim senhor. Não se tinha perigos em vista,
não se carecia de fazer nada. 
(...) Dormi, sestas inteiras, por minha vida. Gavião dava gritos, até o dia muito se esquentar. Aí então aquelas fileiras de reses caminhavam para a beira do rio, enchiam a praia, parados, ou refrescavam dentro d’água. Às vezes chegavam a nado até em cima duma ilha comprida, onde o capim era lindo verdejo. O que é de paz, cresce por si: de ouvir boi berrando à forra, me vinha idéia de tudo só ser o passado no futuro. Imaginei esses sonhos.  
(...)Dormi, nos ventos. Quando acordei, não cri: tudo o que é bonito é absurdo – Deus estável. Ouro e prata que Diadorim aparecia ali, a uns dois passos de mim, me vigiava. 
Sério, quieto, feito ele mesmo, só igual a ele mesmo nesta vida. Tinha notado minha idéia de fugir, tinha me rastreado, me encontrado. Não sorriu, não falou nada. Eu também não falei. O calor do dia abrandava. Naqueles olhos e tanto de Diadorim, o verde mudava sempre, como a água de todos os rios em seus lugares ensombrados. Aquele verde, arenoso, mas tão moço, tinha muita velhice, muita velhice, querendo me contar coisas que a idéia da gente não dá para se entender – e acho que é por  isso que a gente morre. De Diadorim ter vindo, e ficar esbarrado ali, esperando meu acordar e me vendo meu dormir, era engraçado, era para se dar feliz risada. Não dei. Nem pude nem quis. Apanhei foi o silêncio dum sentimento, feito um decreto: – Que você em sua vida toda por diante, tem de ficar para mim, Riobaldo, pegado em mim, sempre!... – que era como se Diadorim estivesse dizendo. Montamos, viemos voltando. E, digo ao senhor como foi que eu gostava de Diadorim: que foi que, em hora nenhuma, vez nenhuma, eu nunca tive vontade de rir dele.
(...) Aquele lugar, o ar. Primeiro, fiquei sabendo que gostava de Diadorim – de amor mesmo amor, mal encoberto em amizade.


                                                                      ...



Guaicuí fica a 30km de Buritizeiro e, aproximadamente, 25 de Pirapora. Hoje é uma cidadezinha muito pacata, mas que no passado fora um importante entreposto comercial devido à sua localização na foz do Rio das Velhas, um dos mais importantes afluentes do São Francisco.
                                       
                                                                     ...

Desta vez não saí tão cedo para pedalar pois o trecho a percorrer até lá era curto, além de completamente plano e asfaltado. Não havia mistérios: bastava voltar à 365 e seguir no sentido norte. Não demorei mais do que uma hora e meia.

Meu interesse ali era o grande monumento construído por homens e pela natureza na margem do Rio das Velhas: uma igreja datada de 1635, toda de pedra, feita por escravos, não concluída e sobre a qual, no lugar em que deveria ser a torre, uma gameleira enorme cresceu dando à igreja um aspecto meio mágico. Eu, que nunca tinha estado ali e tampouco conhecia o passado da rota do São Francisco, ficava a imaginar a vida, tocada pela força daquele cenário:  via embarcações de madeira descendo e subindo o rio, sacos de algodão com grãos, peles, sal; barris de querosene,...vozes gritando na margem, tropeiros, pescadores ...Via a brisa que se enroscava nos galhos da gameleira, a umidade das pedras, o rio manso, o silêncio vegetal das raízes infiltradas nas ruínas...O tempo antigo vivo de novo.  







Cheguei de Guaicuí por volta de três da tarde. O dia terminou na mesa, com o tradicional café com queijo mineiro, na companhia de Rômulo, Edna e simpáticos amigos do casal, que me presentearam com uma lanterna – cinética – e um isqueiro, provisões necessárias para meu tipo de viagem as quais havia esquecido de levar.   

Pirapora

A cidade que cresceu com a navegação a vapor e a chegada da estrada de ferro Central do Brasil também é uma cidade que pedala. Bicicleta é o meio de transporte mais popular da cidade.

Ponte Velha: passarela somente para bicicletas. Pirapora - MG. 2011

Benjamim Guimarães: barco a vapor de passageiros em funcionamento no São Francisco.  

Vai no boteco tomar cerveja? Vai de bike. Pirapora - MG. 2011 

 Estrada de Ferro Central do Brasil. Trecho em estrada no município de Araçaí - MG. 2011.

 Estação da Central do Brasil em Cordisburgo - MG. 2011.