Mas eu olhava esse menino, com um prazer de companhia, como nunca por ninguém eu não tinha sentido. Achava que ele era muito diferente, gostei daquelas finas feições, a voz mesma, muito leve, muito aprazível. Porque ele falava sem mudança, nem sobejo de esforço, fazia de conversar uma conversa adulta e antiga. Fui recebendo em mim um desejo de que ele não fosse mais embora, mas ficasse, sobre as horas, e assim como estava sendo, sem parolagem miúda, sem brincadeira - só meu companheiro amigo desconhecido.
Ele, o menino, era dessemelhante, já disse, não dava minúcia de pessoa outra nenhuma. Comparável um suave de ser, mas asseado e forte - assim se fosse um cheiro bom sem cheiro nenhum sensível - o senhor represente. (...) Se via que estava apreciando o ar do tempo, calado e sabido, e tudo nele era segurança em si. Eu queria que ele gostasse de mim.
Mas, com pouco, chegamos no do-Chico. O senhor surja: é de repentemente, aquela terrível água de largura: imensidade.
Medo maior que se tem, é de vir canoando num ribeirãozinho, e dar, sem espera, no corpo dum rio grande.
Tive medo. Sabe? Tudo foi isso: tive medo! Enxerguei os confins do rio, do outro lado. Longe, longe, com que prazo se ir até lá? Medo e vergonha. A aguagem bruta, traiçoeira - o rio é cheio de baques, modos moles, de esfrio, e susssuros de desamparo.
"Carece de ter coragem..."- ele me disse. Visse que vinham minhas lágrimas? Doí de responder: - "Eu não sei nadar..."O menino sorriu bonito. Afiançou: - "Eu também não sei." Sereno, sereno. Eu vi o rio. Via os olhos dele, produziam uma luz. - "Que é que a gente sente, quando se tem medo?" - ele indagou, mas não estava remoqueando; não pude ter raiva. - "Você nunca teve medo?" - foi o que me veio dizer. Ele respondeu: - "Costumo não..." - e, passado o tempo dum meu suspiro: - "Meu pai me disse que não se deve de ter..."
(...)-"Você é valente, sempre?" - em hora eu perguntei. O menino estava molhando as mãos na água vermelha, esteve tempo pensando. Dando fim, sem me encarar, declarou assim: -"Sou diferente de todo mundo. Meu pai disse que eu careço de ser diferente, muito diferente..." E eu não tinha medo mais. Eu? O sério pontual é isto, o senhor escute, me escute mais do que eu estou dizendo; e escute desarmado. O sério é isto, da estória toda - por isso foi que a estória eu lhe contei -: eu não sentia nada. Só uma transformação, pesável. Muita coisa importante falta nome.
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